Relatório final da CEI aponta irregularidades e recomenda medidas
Relatório final da CEI aponta irregularidades e recomenda medidas
Conforme pôde ser constatado o evento obteve um saldo negativo de R$ 224.612,40
A Comissão Especial de Inquérito (CEI), responsável pela investigação das irregularidades praticadas na realização da Festa do Peão e Baile da Rainha, apresentou seu relatório final, que foi lido durante a 12ª Sessão da Câmara da última terça–feira, dia 17.
O documento aponta a prefeita municipal, Fabiane Santiago (PV) como responsável solidária pelos atos praticados por seus prepostos. De acordo com o relatório, houve desrespeito à Lei 8666/93 que trata de Licitações e Contratos Administrativos em diversas ocasiões, aos Princípios da Administração Pública, previstos no Art. 37 da Constituição Federal, a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei do Orçamento. Além disso, o relatório aponta indícios de que as condutas dos Servidores Públicos constituem atos de Improbidade Administrativa nos termos da Lei 8.429/92.
O relatório final, assim como toda a documentação que o instrui (Processo Nº 165/2009), será encaminhado ao Ministério Público local, ao Ministério Público Federal, ao Tribunal de Contas do Estado e ao Tribunal de Contas da União, para que sejam tomadas as medidas cabíveis necessárias.
Composta pelos vereadores Edmilson Armellei (PP) presidente, Prof. Wanderley (DEM)relator, e Toninho da Rádio (PDT) membro, a CEI também revelou o desvio de finalidade de dinheiro público. Conforme os autos, a Prefeitura utilizou verba da educação (QESE) para cumprir despesas de propaganda em emissora de TV.
Outra denúncia apontada pela CEI diz respeito ao tardio ingresso de valores nos cofres do município. Apesar de o evento ter se encerrado em 07 de Setembro de 2009, o dinheiro arrecadado com a bilheteria do mesmo, que somou a importância de R$ 98.574,50 só foi recolhido aos Cofres Municipais no dia 19 de Novembro de 2009, ou seja, mais de dois meses depois.
O trabalho da Comissão teve como base a juntada e análise de documentos, que superaram 1.950 páginas, e depoimentos de vinte e uma testemunhas que participaram da realização do evento. Foram mais de 170 dias de intensa investigação para a elaboração do relatório final e conclusão dos trabalhos. Durante esse período a prefeita municipal, Fabiane Santiago (PV), impetrou dois mandados de segurança na tentativa de declarar nulos os trabalhos da Comissão.
O RELATÓRIO FINAL:
PROCESSO Nº 165/2009
Trata–se de Comissão Especial de Inquérito, criada para apurar irregularidades nos eventos 1ª Expopiracaia e Baile da Rainha da Expopiracaia, realizados no ano de 2009.
Houve requerimento para a instauração da CEI que foi deferido pelo Presidente da Câmara Municipal, e então foi feito o sorteio dos vereadores que iriam integrá–la, realizando–se logo após a eleição do Presidente e do Relator da Comissão, por seus próprios membros, conforme previsão expressa do Regimento Interno do Legislativo.
Assim, a comissão foi instaurada, tendo como Presidente o Vereador Edmilson Armellei, Relator o que esta subscreve Vereador Wanderley de Oliveira e como Membro o Vereador Antonio Carlos de Souza.
Do Início dos Trabalhos:
Foram iniciados os trabalhos que consistiram na solicitação de documentos referentes à realização do evento investigado aos órgãos competentes da Administração, bem como à oitiva das pessoas que participaram de sua organização.
Em Dezembro de 2009 teve início o Recesso Legislativo, conforme Lei Orgânica Municipal e Regimento Interno do Legislativo.
Da Suspensão em razão de Mandado de Segurança:
Em Dezembro de 2009 o Presidente da Câmara Municipal recebeu a notificação de um Mandado de Segurança (processo 878/09 da 1ª Vara Judicial desta Comarca) impetrado pela Prefeita Municipal de Piracaia, visando declarar nulos seus atos praticados na instauração da CEI.
A notificação informava ainda, que havia sido concedida Medida Liminar determinando a suspensão dos trabalhos da Comissão até o julgamento do processo.
A CEI permaneceu suspensa, e o Presidente da Câmara prestou informações no Mandado de Segurança, esclarecendo que não existiu qualquer irregularidade em seus atos.
Em 02 de Fevereiro de 2010 foi tornada pública a Sentença que denegou a segurança pretendida e revogou a Liminar que determinou a suspensão dos trabalhos da Comissão, que voltou assim aos trabalhos.
Do Retorno às Atividades:
Após a revogação da Liminar e o fim do Recesso Legislativo, a Comissão reiniciou suas atividades, ouvindo mais pessoas envolvidas no evento e solicitando os demais documentos inerentes ao caso.
Em 16/04/2010 o Presidente da Comissão requereu a prorrogação do prazo para sua conclusão por mais 90 dias, o que foi aprovado por unanimidade de votos em Sessão Ordinária da Câmara Municipal.
Novo Mandado de Segurança:
Foi impetrado novo Mandado de Segurança pela Excelentíssima Prefeita Municipal Fabiane Cabral, dessa vez em face do Presidente da CEI Edmilson Armellei, na 1ª Vara Judicial de Piracaia–SP, Processo 89/2010, sob a alegação de que o impetrado praticava atos arbitrários e ilegais, como quando determinou que a comissão retomasse os trabalhos antes da intimação da sentença do primeiro Mandado de Segurança impetrado, e quando não intimava a impetrante para participar das oitivas das testemunhas da CEI.
Após as informações apresentadas pelo impetrado e parecer do Ministério Público, a MM. Juíza proferiu sentença na qual Denegou a Segurança pretendida por não haver nenhuma ilegalidade ou abuso praticado.
Após isso, foi concluída pela comissão a apuração dos fatos.
Dos Fatos Apurados:
Ao analisar os autos é possível constatar diversas irregularidades, abaixo elencadas:
1. Prática de Crime Ambiental na preparação do local do evento:
A Prefeitura Municipal efetuou a derrubada de vegetação nativa em área de preservação permanente para preparar o local onde o evento seria realizado, conforme comprova o auto de infração ambiental juntado às fls. 440 deste processo.
2. Falta de Dotação e Previsão Orçamentária:
Foi apurado que a Prefeitura Municipal não possuía Previsão Orçamentária e Dotação para a realização das despesas obtidas com o evento Expopiracaia, como se pode ver dos documentos juntados a este processo, das fls. 1530 a 1657.
Além do mais, foi apurado que inúmeras despesas foram realizadas sem contabilização junto à Prefeitura Municipal de Piracaia, ou seja, tais despesas não estavam previstas no orçamento do ano 2009.
3. Da escolha do patrocinador e da aquisição de bebidas para o evento:
Conforme se observa do depoimento da Sra. Sheila, Assessora de Gabinete e do Sr. Carlos Balastreire, Diretor do Dep. Cultura e Turismo, respectivamente às fls. 1335/1346, e fls. 1909 a 1933, a empresa Ambev–Brahma, foi uma das patrocinadoras do evento, contribuindo com o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) em favor da Prefeitura Municipal, o que lhe garantiu a exclusividade da venda das bebidas a serem consumidas na festa.
A escolha de tal patrocinador, não foi feita por meio de licitação e sequer houve um contrato escrito entre as partes, ou se houve, não foi juntado ao presente processo, apesar de requerido.
Após esta escolha, foram adquiridas do mencionado patrocinador, bebidas (cervejas) para repasse às barracas do evento, por meio de compra direta, sem Licitação.
A compra foi feita em nome da Sra. Sheila, que entregou um cheque seu para garantir o pagamento.
Essas bebidas foram repassadas às barracas, mediante lucro, pelo Sr. Jorge Fiola, pessoa que não era vinculada à administração pública.
Após o término da festa as bebidas que restaram foram vendidas também sem licitação. Existia até um ponto de venda, que era localizado em um imóvel de propriedade do pai do Sr. Carlos.
A Sra. Sheila sustou o cheque que havia dado e efetuou o pagamento à Ambev mediante depósito em conta. Segundo a Sra. Sheila, o comprovante de depósito está com ela.
Diante do exposto, é possível verificar que houve afronta à Lei 8666/93 e aos princípios da moralidade e publicidade dos Atos Administrativos, no procedimento da contratação com o patrocinador Ambev–Brahma, bem como na compra, repasse aos vendedores e venda das sobras das cervejas do evento em questão.
4. Inobservância da Lei 8.666/93 que regulamenta as Licitações e Contratos Administrativos:
Ao analisar os documentos juntados nestes autos e os depoimentos prestados, pode–se constatar que houve desrespeito à Lei de Licitações em diversas ocasiões, conforme se passa a demonstrar:
I) Existem indícios de fraude no Processo Licitatório para locação dos Sanitários para a festa, pois as empresas Smart Promoções Artísticas e Barnabé Produções Artísticas, que participaram do mencionado certame, informaram um único endereço de suas sedes, como se constata às fls.613 e 616 destes autos.
II) Foram feitas inúmeras despesas em restaurantes, lanchonetes, supermercados, comércios em geral, contratações de mão–de–obra, tudo sem o devido processo licitatório, conforme comprovam os documentos das fls. 1.404, e 1524 até 1657.
III) Conforme comprova Nota Fiscal juntada às fls. 1614, houve a compra de camisetas sem qualquer procedimento licitatório, feita diretamente na empresa de propriedade dos pais do Senhor Carlos Balastreire, Diretor do Departamento de Cultura e um dos principais responsáveis pela realização do evento, o que configura ofensa à lei 8.666/93 e ao princípio da Moralidade Administrativa.
IV) Nas fls. 1656 observa–se o pagamento de R$ 6.000,00 (seis mil reais) referentes a pasto, alimentação e transporte de 50 touros que participaram do evento, indicando um superfaturamento, pois foram apenas quatro dias de Festa, o que não justifica despesa tão alta.
V) Há indícios de fraude na contratação dos Shows musicais apresentados no evento, tendo em vista que a empresa Barnabé Produções Artísticas S/C LTDA ME, possuía a exclusividade dos cinco shows contratados para os exatos cinco dias pretendidos pela Prefeitura Municipal (exclusividade por um dia), conforme se observa dos procedimentos licitatórios das fls. 415 e seguintes, 523 e seguintes, 547 e seguintes, 697 e seguintes bem como das fls. 721 e seguintes, todas do presente processo.
VI) Foi efetuada a compra direta, sem licitação, de areia e pedra de uma pessoa da família do Sr. Carlos Balastreire, como se observa às fls. 1647.
VII) A contratação dos sanitários utilizados no evento (fls. 608 e seguintes) foi alterada no momento da execução, sem que houvesse o devido aditamento do Contrato, como se pode observar no depoimento prestado pelo Senhor Carlos Balastreire, mais precisamente às fls. 1920 e 1921 destes autos.
VIII) Houve a autorização para a criação e impressão de 2 mil leques promocionais para o evento, conforme se vê às fls. 958 a 962, porém, esses leques não foram vistos no evento, havendo indícios de fraude no referido contrato.
IX) Houve a contratação da Rádio 105,9 Cachoeira FM para realização do Baile da Escolha da Rainha da Expopiracaia, por meio de acordo verbal, sem um contrato escrito, em desacordo com a Lei 8.666/93, além do desrespeito ao princípio da Moralidade Administrativa, tendo em vista que o Diretor da Rádio é o Sr. Carlos Balastreire, Diretor do Departamento de Turismo e co–responsável pela contratação. Esse fato pode ser constatado às fls. 1923/1924 e às fls. 1442/1443 destes autos.
X) Foram contratados shows artísticos para o evento por intermédio da Radio 105,9 Cachoeira FM e os pagamentos foram efetuados com dinheiro da bilheteria do evento, sem observância das normas legais aplicáveis ao caso, conforme se constata às fls. 1913 e 1914 destes autos.
5. Contratação da emissora de televisão SBT:
Para as divulgações do departamento de cultura e turismo do município (o que incluí o evento em tela), houve a contratação da emissora de televisão SBT, da qual o Assessor de Imprensa da Prefeitura Municipal de Piracaia era prestador de serviços, como se observa às fls. 1384 e seguintes. O fato do Assessor de Imprensa da Prefeitura, prestar serviços para a empresa contratada pela mesma, afronta ao Princípio da Moralidade Administrativa.
Além disso, é possível observar às fls. 456 e seguintes, que a Dotação de R$ 6.000,00 (seis mil reais) utilizada para pagamento de parte deste contrato, era destinada à MANUTENÇÃO DO ENSINO FUNDAMENTAL–QESE, o que leva a concluir que houve desvio de finalidade do dinheiro público.
6. Recebimento e venda de produtos em nome da Municipalidade por pessoas que não possuem vínculo com a mesma:
Houve o recebimento de produtos adquiridos pela Municipalidade por pessoa estranha ao quadro de servidores da Prefeitura, conforme Notas Fiscais das fls. 1628 e 1630.
Foi constatado ainda, às fls. 1337/1346, e as fls. 1917/1919, que pessoas sem vínculo com a Administração Municipal efetuaram a venda das bebidas às barracas que trabalhavam no evento e posteriormente, a venda das bebidas que sobraram do evento.
O responsável por gerenciar essa distribuição aos barraqueiros foi o Sr. Jorge Fiola, que recebia o valor de aproximadamente R$ 0,10 (dez centavos) por Lata vendida.
Após o término do evento as cervejas restantes foram comercializadas pelo noivo da Sra. Sheila, Assessora de Gabinete da Prefeitura Municipal, e pelo senhor Jorge Fiola, sendo inclusive aberto um ponto de vendas na Rua Jan Antonin Bata, em um prédio do pai do Sr. Carlos Balastreire.
As condutas averiguadas estão eivadas pela ilegalidade, pois pessoas sem vínculo algum com a Administração Municipal, sequer um Ato de Designação, exerciam atividades em nome da mesma.
Resta claro também a ofensa a Lei 8.666/93, com referência a falta de procedimento licitatório ou mesmo um contrato para a compra e venda das bebidas.
7. Depósito em conta de servidora pública:
Segundo se extrai dos documentos da fl. 1553, bem como, do depoimento do Sr. Carlos às fls. 1927/1928, foi efetuado depósito de R$ 2.350,00 (dois mil trezentos e cinqüenta reais), na conta da Assessora de Gabinete, a Sra. Sheila, que seria para o pagamento de aluguel de roupas típicas, para a rainha do evento, procedimento inaceitável no âmbito da Administração Pública.
8. Público estimado no evento e preço dos ingressos:
Ainda no depoimento do Sr. Carlos Balastreire, mais especificamente às fls. 1922/1924, é possível verificar que não houve um controle adequado de pessoas que entraram no evento, o causou prejuízo financeiro aos Cofres Públicos, pois diversas pessoas entraram sem pagamento, até com o consentimento dos responsáveis pela portaria.
É possível ver também que ocorreram variações no preço dos ingressos, sem uma definição específica, o que torna duvidosa a apuração do público e receita, contrariando o dever de Transparência e Publicidade da Administração Pública.
9. Ingresso tardio de valores nos cofres do município:
Apesar de o evento ter se encerrado em 07 de Setembro de 2009, o dinheiro arrecadado com a bilheteria do mesmo, que somou a importância de R$ 98.574,50 (noventa e oito mil quinhentos e setenta e quatro reais e cinqüenta centavos) só foi recolhido aos Cofres Municipais no dia 19 de Novembro de 2009, ou seja, mais de dois meses depois, conforme se verifica às fls. 1145 e 1147.
10. Realização das despesas sem dotação:
Foram assumidas inúmeras despesas sem que o dinheiro estivesse disponível para o pagamento das mesmas, pois somente em 20 de Setembro é que a verba do Ministério do Turismo foi disponibilizada na conta bancária correspondente, conforme se verifica às fls. 1756.
11. Da responsabilidade da Prefeita Municipal:
A responsabilidade da Prefeita Municipal de Piracaia é solidária. In casu, verifica–se que a maioria dos atos ímprobos e o cometimento de vários crimes ocorreram a partir da interferência direta da Alcaide. As autorizações para realização de despesas foram emitidas pela Prefeita Municipal. A autorização para realização dos eventos sem prévia dotação orçamentária também se deu por conta e risco da Chefe do Executivo. A demora na contabilização dos gastos, notadamente a entrada do numerário arrecadado nos cofres públicos, também ocorreu com total conhecimento da Prefeita Municipal. Note–se que o próprio Sr. Carlos Balastreire afirmou que o dinheiro arrecadado ficava armazenado no cofre localizado dentro do gabinete da Prefeita.
A jurisprudência de nossos Tribunais reconhece que há responsabilidade solidária do Prefeito Municipal na prática de atos de improbidade praticados por servidor municipal (cf. ApCv nº 70028370740 – TJRS – Rel. Des. Agathe Elsa Schmidt da Silva).
Conclusão:
Considerando os fatos expostos, esta Comissão conclui que houve desrespeito à Lei 8666/93 que trata de Licitações e Contratos Administrativos em diversas ocasiões, aos Princípios da Administração Pública, previstos no Art. 37 da Constituição Federal, a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei do Orçamento.
Conclui ainda, que existem indícios de que as condutas dos Servidores Públicos elencadas neste relatório, constituem atos de Improbidade Administrativa nos termos da Lei 8.429/92.
Ademais, cumpre esclarecer que a Prefeita Municipal é solidariamente responsável pelos atos praticados por seus prepostos.
Assim, esta Comissão recomenda seja encaminhada cópia integral destes autos ao Ministério Público desta Comarca, ao Ministério Público Federal, ao Tribunal de Contas do Estado e ao Tribunal de Contas da União para a adoção das medidas necessárias em face das irregularidades apontadas.
Câmara Municipal de Piracaia–SP, 05 de Agosto de 2010.